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quinta-feira, 14 de maio de 2009

Politica e Desverdade (é só brincadeira)...

Politica e Desverdade

Politica da Verdade

Um ex-politico do PC passeia-se nas hostes dos seus antigos co-rrelogionários: Para quê?

Peer Steinbrück, Ministro das Financas na RFA: “Näo haverá aumentos nos impostos” - Chanceler alemä convence cristäos-democratas a prometer reducöes dos impostos, para todos...

 

Pode-se pressupor como do conhecimento geral, que a verdade näo existe. Gracas a Deus acrescentam alguns cérebros mais prudentes – que onde a verdade ainda era enquadrada em palavras, sempre foi pronunciada em acto único e jamais discursivo (monocursivo é o sermäo, aquilo que se ouve por forca e obrigacäo, discursivo é o ping-pong das ideias e opiniöes, é a Ágora, a praca publica) pelo poder dominante (um parentesis para insinuar a justica de forca em detrimento da injustica do Poder), respectivamente pelos seus mandatários. Para apurar este feito, näo necessitamos nem Nietzsche, que incessante o proclamou, quase em mania, nem a Teoria dos Jogos da Linguagem de Wittgenstein (“o falar de uma linguagem é parte de uma actividade, ou de uma forma de vida”), täo pouco da sabedoria historica generalizada.

Mas entre a verdade e a mentira lustrada (uma mentira, que passa despercebida, sem vestigios, que omite as condicöes da sua origem e oculta as intencöes do seu efeito; simultaneamente uma mentira que insiste, que foi apenas o sujeito enganado que ali escorregou) encontram-se inumeros mundos do possivel: näo é, por tal,  necessário mentir sempre, onde apenas näo se quer dizer a verdade.

Quando por sistema a mentira prevalece no leque das modalidades da omissäo da verdade, convém postar-se em cautela: estamos entäo no Império das Ilusöes (o que em si näo significa algo de condenável, como se existesse algo de “condenável em si”...). Triste sim poderia ser, que a esta uma vida, que vivemos exaustivamente como ilusäo, talvez pudessemos ter dado uma outra forma – quicas com maior expelicäo de morfinas endogénicas, mais simplesmente dito: com maior teor de felicidade.

A verdade foi para a Politica sempre pensada como degrau na escada caminho arriba, näo cursus honorum mas sim illudo ergo sum (iludo, por tal existo), sempre mais algo a ser feito, e muito menos algo a ser dito: “faz o que eu digo e näo digas o que eu faco” (por fraude e insensatez a lingua denomina “maquiavélico” precisamente o pronunciar desta  constatacäo). De outra forma a Politica, o viver indeliberadamente em comunidade, é impensável. A verdade seria sempre que, e aqui seria condiscente um recurso a Nietzsche, a vida na polis significa sempre „viver apesar de”, equivale ao “sobreviver antes de”  e ao “afinal porque näo?”: uma infima vantagem na educacäo dos filhos, um safir pretenciosamente insignificante para a mais querida, uma refeicäozita algo mais vantajosa.

Teria-se que, se se pudesse, medir os politicos näo numa escala de verdade, mas numa escala bordada e florida, rotulada no bordo superior „descaramento “e no inferior „com a graca, que o feito de ser humano me facilita“.

Se existe uma diferenca entre a „desverdade politica“ cesariana e a nossa, a pós-burguesa, a moderna?

Primeiramente aquela, é o Imperador quem cria a verdade, ao „dize-la“. A dicotomia näo é verdade e mentira, mas sim verdade e submissäo. Também o escravo imperial, o filósofo de casa, a esposa, a hetara e a concubina, outras etnias e habitantes de outras paisagens teräo tido as suas próprias “verdades”, mas quando a verdade imperial e a näo-imperial colidiam, näo era o seu mais de “verdade” que era investigado – esta foi a invencäo da Inquisicäo – mas era uma que se sobrepunha, sem excepcäo através da violencia (por mais que haja vindo sorrateiramente em forma de submissäo, como a verdade cristä).

O Tirano perdura enquanto a massa nele anteveja a corporizacäo mais sensata e eficiente dos desejário colectivo. Aomomento em que é manifesta a incapacidade do Imperador em aviar o icone do „mais“ (mais terra, mais mulheres, mais cereais, mais circo e mais päo, mais seguranca, mais progresso colectivo), está lacrado o seu ocaso. Este, à parte, o paralelismo que Hitler, Mussolini e todos os ditadores do século XX discerniram no horizonte do seu futuro: o Império Milenário, os Impérios coloniais, os Fascios (feixes), por fim também aquilo em que se converteram as utopias sociais. Todos os Imperadores imperam enquanto a massa o possibilita, enquanto nela anteveja a forma mais eficiente da sua ascencäo. A derradeira estratégia dos Imperadores contra o seu destino foi declarar o rebolico geral contra inimigos reais ou imaginados (em Outubro de 1944, a 150 dias do seu suicidio, Hitler decretava o “povo em tumulto” (Volkssturm), inserindo criancas e velhinhos, tortos e aleijados na tormenta colectiva). A talvez mais fatidica vinganca dos Imperadores é desfazer-se de todos aqueles que näo compreendem, para finalmente eles mesmos poderem entender o mundo.

O politico moderno, pelo contrário, näo corporiza sonho algum (como se a humanidade houvera perdido a nocäo do sonhar), pratica a sua vida sob a mirada do público. O politico moderno é um servidor do sistema, que opera sem querer originar, que näo se responsabiliza nem é resposabilizado pelo sentido ou consequencia dos seus actos (o simples soldado em Abu Ghreib é condenado a 20 anos de prisäo, impune pelo contrário toda a linha de obediencia que o conecta à presidencia estado-unidense).

E os sonhos convertidos realidade (o movimento ecologista, as democracias sul-americanas, eleicäo de Obama, os politicos simpáticos à la Lula) säo os sonhos despojados.

A segunda grande diferenca entre César e o Politico Moderno: quando a verdade imperial era vivida como simples supersticäo, era a vez do imperador pagar pelos seus actos (a impossibilidade da concretizacäo definitiva dos sonhos da massa) – o destino comum dos imperadores romanos, como dos arlequins fachistóides do século XX e do resto dos ditadores näo fascistas. A corporizacäo da esperanca da massa era entäo eliminada, com regularidade fisicamente. O politico moderno, pós-burgues, näo tem mais que temer a integridade fisica. Também ele “inventa” desverdade com perfeita lubrificacäo, mas näo tem mais pudor publico, näo recorre mais ao punhal ou ao cálice de cicuta para repor a honra.  Abdica ou é des-eleito, e vai andando, regressa à massa protectora.

Se os imperadores e os politicos säo objectos da público (o termo moderno para „massa“), terá que haver sucedido algo com o publico, que iniciou esta viragem (do instante em que o insucesso era contabilizado com a própria vida para o momento em que a vida só vale a pena ser vivida depois do fracasso – a “re-forma”).

Poderiamos colocar o ponto de viragem na Inquisicäo (existe uma verdade, e esta verdade pode ser extraida, se necessário na fogueira e na camara de instrumentos – esta imagem da domesticacäo do diabo perante as máquinas de tortura tem algo de patético e comovente). Tem também o seu quê de mal estar e desconforto que sejam os próprios sucessores da Inquisicäo que hoje vendam a camara de instrumentos como melhoramento nas condicöes de ser da humanidade. O estandarte da tortura e do crime sempre foi uma representacäo de Deus e só na imaginacäo literária o crime “gratuito” (que näo tem preco, plenamente despojado de intencäo) é obra do Diabo.

E a atracagem deixa-se bem realizar na primeira Declaracäo dos Direitos Humanos: se todos os seres humanos säo iguais, maior probabilidade que sejam os meus próprios sucessores o futuro icone dos sonhos colectivos – compreensivel que näo deseje para a minha procria biológica o destino de um Nero, de um Julio César ou um Cidadäo Louis Capet – é só brincadeira, criancas! Brinco, do latim, illudo, in ludere, para: brincar em, atirar brincando, lancar os dados, estar em jogo...

terça-feira, 3 de março de 2009

do bonito das coisas bonitas

"Os homens amam o que desejam e as mulheres desejam o que amam", eis um bom exemplar daquilo que poderiamos apelidar de "uma frase bonita" - esta, que inclui a outra, pelo contrário, um otimo exemplo de uma näo bonita.
É o lema de capa ou contra-capa, de um livro que me ofereceu a minha namorada comprometida, com a gentileza de näo colocar dedicatória, como sou um homem poli-comprometido, cujo titulo insinua um mapa ou uma descricäo de percurso: "Onde Reside o Amor" de Margarida Rebelo Pinto. É um livro muito bonito também (isto quer implicar que poderá haver livros que contenham muitas frases bonitas, mas näo sejam livros bonitos - este parentesis requer uma explicacäo que segue mais tarde), um livro de amena digestäo, escrito por uma senhorita queque e alfacinha (esta fixacäo de "queque e alfacinha" é a minha visäo dos anos 70 da mullher emancipada: atrevida - este o siginificado do keck em alemäo -, sensual, independente, responsável com ligeireza nas saias curtas).
Regressando ao moto inicial, ao "os homens que amam e as mulheres que desejam" - é uma frase escandalosamente simples, que näo requer explicacöes adicionais, daquelas sentencas que comumente citamos afirmando: "Como já dizia a minha avó", ou "como bem sabia o meu avô" ou "já a minha tia previa". E, aí nasceu a minha suspeita: Porquê essas frases que com frequencia cremos que houveram poder sido postuladas pelos nossos ancestrais menos complexos e mais ligados à vida, em toda a generalidade säo expressas por pessoas que só säo menos complexos no sentido que depassaram essa complexidade, transmitindo conteudos complexos em frases simples? Porquê, entre as pessoas que nos transmitem essas frases que podiam ser dos nossos pais, ou bisavós ou sei lá eu o quê, figuram nomes como Fernando Pessoa (figura altamente erudita e poliglota), Chico Buarque (familia de enciclopedista, sociologos, intelectuais), Erwin Schrödinger (o tal da mecanica quantica), Richard Feynman e por aí fora? E por que razäo dos meus avós, senhores que compartilhavam a noite com a natureza entre lobos, caes da Serra, cabras e ovelhas - näo me recordo dessas frases?
Li há algum tempo de um pensador moderno que sob o efeito de estupefacientes ficava atonito da simplicidade e da clareza do mundo, e mais atonito pelo esquecimento do porquê dessa justificacäo do mundo constantemente conjugado com o findar do efeito do estupefaciente. Até que um certo dia antes de acender as primeiras passitas, colocou um caderno e uma esferografica à mäo para anotar a quinta-essencia do mundo, quando ela lhe viesse, o que näo se fez esperar.
No dia seguinte depois da ressaca, abriu a sua sebenta e encontrou a razäo de ser de todas as coisas, que havia anotado no dia anterior: "Tudo no mundo tem um odor parecido ao petróleo".

Um livro näo é aquela coisa geralmente mais comprida que larga, encadernada. com as folhas cortadas a prumo. Um livro é aquilo que sucede entre essa coisa encadernada e a cabecinha através de cujos olhos as palavras nele impressas se re-produzem de pernas para o ar. No fundo, nem uma reproducäo é, mas sim um jogo, um cintilar que efectua entre os dois - entre o livro e o seu leitor. Este é um tema de Jorge Luis Borges, näo há livros bonitos em si, nem leitores feios em si, há juncöes malogradas e há juncöes sucedidas. O livro certo na pessoa certa, aí reside a literatura. É um tema de Blumenberg também, "ler é escrever", e, mais remotamente, o tema da fenomenologia - ter consciencia de näo é aperceber qualquer coisa exterior ao perceptor, mas sim preencher a distancia que está entre ambos.