domingo, 6 de julho de 2008

sobre algumas dificuldades em adquirir a felicidade por encomenda...

Escutei em diversos lugares "passem bem", "sejam felizes". Como väo digiridos a uns tantos, porque é isso que nos ensina a concordancia gramatical, näo sei se é uma "passagem de bem" e uma felicidade a serem repartidas pelos destinatários, ou se se tratará mais de uma bem-passagem e felicidades sem volume, incomensuráveis, da mesma forma que se diz de um rio que leva água e näo se espera que a água que o rio leva algum dia se esgote.
Incomoda-me o imperativo, o "sejam!" e o "passem!", por trás dos quais sempre se vislumbra um ar sério, uma face imposante, acompanhados de um olhar expressivo e autoritário. Entäo, e se eu quizer a felicidade só para mim? Ou, se eu näo quizer ser feliz? Recordo que näo sei em que país islamico o suicidio consta no Código Penal que poderá ser punificado com pena de morte. Bem, há felicidades e há felicidades, a verdade seja dita, e aqui até que a justica tem algo de justo. Como geralmente säo expressos em tom de voz elevado os "SEJAM FELIZES!!!" e "PASSEM BEM!!!", assusto-me constantemente, dou logo um pulo da cadeira, e fica um exagero de adrenalina no meu sistema hormonal, que necessita de tres voltas pelo quarteiräo que inclui entre outras a minha casa.
Bem, tenho uma teoria: que esses votos aparentemente bem intencionados, nem sequer a aparencia de bem intencionados querem adquirir. E que o "Sejam felizes!" significa "sem mim", o equivalente a um "Vai à vida, pá!"
Ou, colocando a questäo em termos mais filosóficos ("Filosofia é quando se ri" dizia Blumengerg, "e ri-se por falta de juizo"): Arthur Schopenhauer publicou num pequeno tratado intitulado "Dialéctica Eristica - A arte de sempre ter razäo" 38 truqes de como atingir essa finalidade. Diz-se que, origináriamente Schopenhauer havia querido prever um epilogo logo na primeira edicäo, mas que se convenceu que era um aviso redundante, porque haveria sómente duas leituras possiveis, uma leitura sarcástica, acompanhada de um sorriso permanente e uma leitura insensata, que necessitaria dos 38 truques para simular a sensatez. Desde entäo ambas as fracöes atiram-se com "passem bens" e "sejam felizes".
P.S.
Eris foi a Deusa da disputa grega (a Discórdia romana), filha de Nyx, Deusa da Noite (e da noite e do caos nasceu o dia). De Eris canta Homero na Iliada: "O que ela alguma vez haja comecada näo pode jamais abandonar. O seu pequeno vulto ergue-se para um tamanho e beleza gigantescos". E, como da beleza nasceu o Amor, também os inimigos (os idolatrantes da Discórdia) teem que se merecer! (Näo sei de onde eu roubei isto, mas a sua poesia näo pode evidentemente ser - só - minha.)

Sem comentários: